A casa – Ponto de encontro entre duas histórias

“…Nesta casa
Há segredos
Há sonhos
Há passado
Há histórias
Há saídas para outras paragens…”

 

janela com

Vi-te à janela e
Revivi épocas de outrora
Nesta casa
Nasci e cresci
Amei
Tornei-me mulher
Namorei e casei
E filha nasceu
Memórias que ficarão em mim para sempre

Nesta casa
Senti-te minha mãe
Senti-te meu pai
Senti-te meu irmão
Senti-te meu marido
Senti-te minha filha
Senti amor
Senti vida
Sentimentos que ficarão em mim para sempre

Nesta casa
Vi-te morrer meu pai
Vi-te adoecer minha mãe
Vi silêncio
Vi solidão
Vi tristeza
Mas também vi festejos
Vi alegria
Vi amor
Vi vida
Lembranças de todos em mim para sempre

Nesta casa
Há segredos
Há sonhos
Há passado
Há histórias
Há saídas para outras paragens
Procurei outro lugar porque a vida empurra

Nesta casa
Há novas gentes
Há novas vidas
Há uma nova casa
Há novos amores
Há novas histórias
Há que continuar o tempo que sobra em nós para sempre

D.

Um dizer ainda puro

“diz-me que há ainda versos por escrever,
que sobra no mundo um dizer ainda puro.”

Um dizer ainda puro
imagino que sobre nós virá um céu
de espuma e que, de sol em sol,
uma nova língua nos fará dizer
o que a poeira da nossa boca adiada
soterrou já para lá da mão possível
onde cinzentos abandonamos a flor.

dizes: põe nos meus os teus dedos
e passemos os séculos sem rosto,
apaguemos de nossas casas o barulho
do tempo que ardeu sem luz.
sim, cria comigo esse silêncio
que nos faz nus e em nós acende
o lume das árvores de fruto.

diz-me que há ainda versos por escrever,
que sobra no mundo um dizer ainda puro.

Vasco Gato

Um mudo imperfeito onde “tudo está por fazer”

Há que fazer ainda muitas coisas: … Sacudir as asas e pintá-las de novo
Com as cores que nos empresta o dia. …

Há que fazer ainda muitas coisas:
Varrer o pátio,
Regar as margaridas,
Sacudir as asas e pintá-las de novo
Com as cores que nos empresta o dia.

Tocar guitarra
e lançar ao vento as sementes
e aconchegar num altar secreto
as tristezas novas que nos guarda o dia.

Há que fazer muitas coisas:
retomar a canção velha e perdida,
beber as suas águas, caminhar na sua terra
enquanto sabemos que é nosso o dia.

E aprisionar a sombra
(ela sofre pesadelos tremendos),
é nostálgica e cheia de loucuras;
torna-nos trágicos a metade dos dias.

Há que fazer muitas coisas!
Abrir o sol, abrir os cortinados
que já teremos tempo suficiente
para beber as sombras quando acabe o dia

Matilde Casazola

Imagem retirada da Web em: https://www.consuladodebolivia.com.ar/2016/12/21/vida-obra-matilde-casazola-mendoza/