#2 – O Professor inesperado

Durante quatro dias fiz o papel de “professor”, mas como criança que era, aproveitei para negociar com os faltosos, livrando-os da indicação do seu nome na lista que, todos os dias dava à professora.

Na minha terra a escola primária tinha duas salas, uma virada a norte, a sala de cima, sombria todo o ano e muito fria no inverno, onde andavam os alunos da 2ª e 3ª classes, a outra virada a sul, a sala de baixo, mais quente e luminosa, onde andavam os alunos da 1ª e 4ª classes. Na sala de cima não havia tantas reguadas, não tanto por os alunos não darem erros ortográficos, ou errarem nas contas ou ainda por faltas de trabalhos de casa, mas sim porque a “regente” preferia dar-lhes outros castigos, sentava-os no fundo da sala virados para a parede e obrigava-os a repetir tudo até que ficasse bem feito.

livro primária

Livro da 2ª classe dos anos 60

Na época, a(o)s professora(e)s da instrução primária, que não tinham completado o curso do Magistério Primário eram designada(o)s por “regentes”. A professora Clotilde, uma senhora nova e muito carinhosa, sempre pronta a ajudar os que tinham mais dificuldade, era a “regente”. A professora Ofélia, mais velha, era muito rigorosa e muito inflexível com as falhas dos alunos.

Nessa época as aulas iniciavam-se, normalmente, a 7 de outubro, exceto se coincidisse com um domingo ou feriado. No primeiro dia de aulas do ano letivo de 1961/62, os alunos que tinham passado para a segunda classe compareceram, como era a regra, na sala de aula da professora Ofélia. Esta, um a um, nomeava-os para se apresentarem na sala de cima. Sentados a par nos bancos das carteiras, estávamos um pouco ansiosos por ouvir o nosso nome na ordem dada pela professora Ofélia: João… sala de cima, Marília… sala de cima….

Carlos recorda-se bem dessa etapa da sua vida e desse primeiro dia de escola – Sentíamos-nos inquietos, mas o olhar firme da professora Ofélia, percorrendo toda a sala, deixava-nos imóveis e silenciosos, apenas se ouvia o pequeno ruído do aluno que se levantava à chamada para se dirigir à sala de cima. Um a um, via os colegas saírem radiantes em direção à sala de cima e fui ficando cada vez mais ansioso por não ouvir o meu nome. Já com o coração aos pulos pois sabia que os que tinham passado de classe já tinham sido nomeados, senti-me o mais infeliz de todos e pensava: Não pode ser, eu fui o único aluno que não apanhou reguadas, sabia que ia para a segunda classe e até pensava que a professora gostava de mim, mas não me atrevi a dizer nada, tal era o respeito (ou mesmo medo) que a professora impunha.

Terminada a nomeação, e já na sala, com os alunos da 4ª classe e dos que entraram para a 1ª classe, a professora Ofélia disse: Carlos, tu ficas na minha sala porque quero ser eu a acompanhar-te até à quarta classe. Ainda retorqui: mas eu gostava de ir para a outra sala, os meus pais não vão acreditar em mim, vão pensar que é um castigo, e o meu pai ainda me pode bater. Quanto a isso não te preocupes, eu mesma irei falar com eles, disse a professora Ofélia.

Livro da 2ª classe dos anos 60

Ia o ano letivo de 1962/63 decorrendo, quando a professora Ofélia adoeceu, o médico mandou-a ficar em casa durante quatro dias. Era terça-feira, como habitualmente, chegámos às 8.30h à sala de aula e sentámo-nos nos nossos lugares. A professora Clotilde entra na sala e, para espanto de todos, diz-nos: A professora Ofélia está doente e não virá dar aulas o resto da semana. Manda nomear o Carlos para ficar a tomar conta da sala de aula, a anotar quem não sabe a lição, quem não faz os trabalhos de casa e quem se porta mal. Todos os dias virei indicar a lição a estudar e os trabalhos de casa a fazer e o Carlos dá-me a lista com os nomes dos que não sabem a lição, dos que não fazem os trabalhos de casa e os que falam – era uma forma de dizer que não se comportavam devidamente – na sala de aula.

Eu nem queria acreditar! Ia “mandar” nos mais velhos que já andavam na quarta classe.

Foi assim que durante quatro dias fiz o papel de “professor”! Mas, como criança que era e pobre, sem direito a guloseimas, aproveitei para negociar com os faltosos, livrando-os da indicação do seu nome na lista que, todos os dias levava à professora Clotilde. Assim, quando algum me vinha pedir para não por o nome dele, negociava as contrapartidas: conhecedor das possibilidades de cada um, exigia tangerinas, laranjas não por serem mais ácidas, maças, rebuçados, bolachas e nalguns casos, “santinhos” (imagens de santos impressas em pequenos cartões).

Frequentei toda a escola primária sem ter os livros, mas como a minha vontade de aprender era grande bastavam-me uns breves minutos para estudar a lição do dia pelo livro que o meu colega de carteira me emprestava, enquanto a professora escrevia o sumário no quadro.

Uma das tarefas em que os alunos normalmente tinham dificuldades era nas operações com frações. O Fernando, um rapaz da minha idade, tinha uma bicicleta, coisa rara por ali, que utilizava para ir para a escola, não se entendia bem com os trabalhos de matemática e em especial com as frações. Logo pensei: tenho aqui a minha oportunidade para dar umas voltinhas de bicicleta. Eu ensinava-o na resolução dos exercícios e ele deixava-me dar umas voltas com a bicicleta, mas, sem me perder de vista.

As frações no livro da 2ª classe dos anos 60

Histórias vividas em tempos difíceis, durante a infância e juventude, aguçam a imaginação e o engenho na superação dos obstáculos ao longo da vida.

 

Esta segunda história/crónica faz parte de uma série de outras histórias feitas de imaginação e memórias:

#1 – O Carteiro e o Retrato

 

Feijoada de Seitan à Hucilluc

Uma alimentação equilibrada, variada e completa, é fundamental para a saúde promovendo o nosso bem-estar geral.

Como é fácil fazer uma alimentação saudável! Mas nem sempre nos lembramos disso, confesso que nem sempre fui cuidadosa com a minha alimentação e por vezes fui até relutante em experimentar coisas novas.

Mas a idade tudo ensina e este verão numa “visita” ao hospital por causa de uma intensa dor na zona lombar que me impedia os movimentos foi-me diagnosticada a diabetes, que como sabem é uma doença crónica por insuficiência de insulina, a glicose permanece no sangue e pode causar danos em muitos tecidos do organismo. Na verdade tive todos os sintomas mas não lhes dei a importância devida, a saber: urinar em grande quantidade e mais vezes, sede constante e imensa, boca seca, fome constante, cansaço e visão turva.

Tudo se conjugava para aderir às recomendações dos médicos e fazer uma dieta equilibrada, variada e completa: não ingerir gorduras saturadas – fritos, queijo, manteiga optar por gorduras monoinsaturadas (azeite) e polinsaturadas (salmão e cavala), reduzir a ingestão de sal, fibras, como por exemplo, pão de mistura ou centeio, lentilhas, aveia, ervilhas, grão entre outros, frutas (3 a 5 porções de frutas) e legumes, 1,5 a 2 litros de água por dia e cerca de 150 minutos de exercício físico por semana.

A minha filha e o meu marido sendo adeptos de uma alimentação saudável convidaram-me para um almoço buffet vegetariano. Finalmente comi seitan, tipo jardineira, com legumes. Não desgostei mas faltava o meu tempero, a minha mão e assim decidi recriar e fazer uma feijoada de seitan, porque não?! Receita muito simples de fazer e em jeito de agradecimento às minhas amigas, que me deram muita força e muitos mimos Aqui e Ali fica a receita da Feijoada de Seitan à Hucilluc!

seitan celeiroImagem do site do Celeiro em: https://www.celeiro.pt/cuide-de-si/temas-de-saude/seitan

Ingredientes:

  • 250g de seitan
  • 1 couve coração
  • 2 nabos
  • 1 lata de feijão branco
  • 1 lata de tomate pelado
  • 2 copos vinho branco
  • 1 cebola
  • 3 dentes de alhos
  • Caril q.b.
  • Louro, sal, pimenta preta moída, piripiri q.b.
  • Salsa ou coentros picados

Preparação:

Cortar o seitan às tiras, temperar com sal, caril, pimenta, regar com um copo de vinho branco e deixar a marinar cerca de 30 minutos.

Fazer um refogado em azeite com cebola e alho. Quando a cebola se apresentar macia e transparente acrescenta-se o tomate, louro e por fim o copo de vinho branco. Temperar a gosto com sal, pimenta e piripiri. Adicionar o feijão branco e deixar refogar em lume brando. Entretanto enquanto a couve coração e os nabos estão a cozer frita-se o seitan num fio de azeite, vão-se virando as tiras até ficarem douradinhas e finalmente acrescenta-se a marinada, deixar apurar e juntar à feijoada.

De seguida colocar as couves cozidas, os nabos cortados aos quadradinhos e uma concha da água das couves à mistura e envolver bem. Fica a apurar um bocadinho e retifica-se os temperos. Retirar do lume e adicionar salsa picada ou coentros e depois é comer e chorar por mais.

Acompanhei com beterraba e rebentos de feijão mongu de vinagrete  fresquinhos.

Espero que gostem desta aventura na cozinha e se atrevam a fazer mesmo com outros ingredientes (courgete, chuchu…), os que tiverem na dispensa ou no frigorífico. A imaginação essa é sua, introduza o seitan na sua alimentação diária e sinta os seus benefícios.

Mas o que é o Seitan? É a partir do trigo que se fabrica o seitan. É um ótimo substituto da carne. É rico em proteínas, possui um teor baixo em gorduras (sem gorduras saturadas nem colesterol). Possui ainda algumas vitaminas e minerais. Atenção: os celíacos não o devem ingerir, já que não toleram o glúten.

Bom apetite!

 

 

 

 

 

 

 

 

Vamos Cozinhar! – Francesinhas

Uma receita de “Francesinhas” que nos foi dada por um portuense amante da boa cozinha da região.

Hoje, conforme prometido, partilhamos uma receita de “Francesinhas” que nos foi dada por um portuense amante da boa cozinha da região.

Para o Molho

  • 1 cebola e 2 dentes de alho
  • 1/2 chávena de Polpa de tomate
  • Picante – em pó ou liquido
  • 1 cálice whiskey
  • 1 cálice de cerveja
  • 1 cálice de vinho branco
  • 1 cálice de vinho do porto
  • 1 colher de sopa de molho inglês
  • Farinha maisena QB
  • Sal, uma folha de louro e ½ cubo de caldo de carne.

O molho leva, vinho branco, whisky, cerveja e vinho do Porto, mas o álcool evapora na confeção e o caldo fica com um sabor, rico e aveludado.

Para dar mais sabor à sopa, use as aparas dos bifes, que vai utilizar nas francesinhas. Comece por refogar em azeite a cebola picada e o alho. Quando alourar junte a folha de louro, o vinho branco e a cerveja. Deixe ferver um pouco e adicione a polpa de tomate, o 1/2 cubo de caldo de carne e um pouco de sal, se necessário junte um pouco de água. Deixe ferver bem e junte o Vinho do Porto, o whisky, o molho inglês e o picante  a gosto.

Ferver mais um pouco e quando estiver bem apurado, juntar a farinha diluída num pouco de caldo morno. Vá juntando à sopa mexendo sempre até ficar um creme aveludado.

Preparar a Francesinha

  • Pão de forma de padaria para se poder cortar as fatias em casa. Use um pão de boa qualidade
  • Bife da vazia fino
  • Salsicha fresca
  • Linguiça
  • Queijo
  • Fiambre
  • Rodelas de chouriço

Grelhar o Bife e colocar sobre uma fatia (fina) de pão de forma. Passar na chapa as outras carnes (abrir a salsicha fresca e a linguiça e passar dos dois lados), apenas para corar e colocar em cima do bife, o fiambre, as rodelas de chouriço a linguiça e a salsicha fresca.

Colocar uma fatia de pão de forma por cima, levar ao grelhador, com calor por cima e por baixo, até tostar o pão, sem deixar torrar completamente, para ganhar alguma dureza e não empapar quando colocar o molho na altura de servir. Colocar as fatias de queijo por cima do pão, uma em cada lateral e uma no centro. Deitar o molho, ainda quase a ferver, sobre a Francesinha de modo a que o queijo fique fundido.

Em muitos restaurantes, por cima da Francesinha é colocado um ovo estrelado e acompanha com batatas fritas.

Sirva à mesa e imagine-se a saborear esta iguaria tão típica, na bela cidade do Porto.

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O Porto, a história, as Francesinhas e não só …

“Lá na leal Cidade, donde teve Origem (como é fama) o nome eterno De Portugal, …” Os Lusíadas, Luís Vaz de Camões

Aqui e ali, percorremos locais que nos falam de nós, da nossa história, cultura e gastronomia.

O Porto, a Invicta cidade edificada em vertentes de acentuado declive sobre o rio Douro.  Estas características da topografia e da hidrografia, com o casario do seu centro histórico disposto ao longo de ruas estreitas e tortuosas que nos conduzem à zona da Ribeira, conferem-lhe um aspeto medieval, labiríntico e de uma beleza única. Do muito que pode experienciar e admirar no Porto deixamos aqui uma pequena reportagem.

Bem no coração da cidade, a estação ferroviária de São Bento, interface de caminhos de ferro da Linha do Minho, é um local incontornável. Aqui pode admirar os magníficos painéis de azulejos de temática histórica. Os azulejos são provenientes da Fábrica de Sacavém da autoria de Jorge Colaço que na época era o mais reconhecido azulejador em Portugal.

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No topo da topo da Rua dos Clérigos surge o ex-libris da cidade, o conjunto arquitetónico constituído pela Igreja, Torre dos Clérigos e a Casa da Irmandade.

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Continuando com a temática dos azulejos, não deixe de apreciar a Capela da Almas também conhecida por Capela de Santa Catarina, na freguesia de Santo Ildefonso. Tem a sua origem numa antiga capela feita em madeira e erguida em louvor de Santa Catarina. Em 1929, as paredes exteriores foram totalmente revestidas a azulejo, com cenas da vida de São Francisco de Assis e de Santa Catarina. São da autoria de Eduardo Leite e executados na Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego, em Lisboa. 

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Na praça da Batalha, a Igreja de Santo Ildefonso de Toledo, construída em 1739,  possui duas torres sineiras e com as paredes adornadas de azulejos de Jorge Colaço (1932), com cenas da vida de Santo Ildefonso e alegorias da Eucaristia.

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Depois de um café no luxuoso e romântico Majestic, que nos remete para a “Belle Époque” dos anos vinte, não deixe de visitar a Livraria Lello & Irmão e aprecie o seu extraordinário valor histórico e arquitetónico, cujo interior guarda outras preciosidades incluindo os livros. 

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As Francesinhas e não só!

Cervejaria

Nas muitas e excelentes opções para um almoço reconfortante, encontra-se a “Cervejaria Brasão” na rua dos Aliados.

Um espaço agradável e bem decorado com um toque de atualidade quer no espaço quer nas refeições servidas. Aqui para além dos vários petiscos muito bem apresentados pois os olhos também comem, temos as deliciosas e tão características francesinhas. 

Esteja atento(a) pois, brevemente, iremos publicar uma receita tradicional das francesinhas.

O fim de tarde perfeito passado numa esplanada na Ribeira, apreciando o vinho do porto na forma de cocktail feito com vinho do Porto branco e água tónica, guarnecido com uma rodela de limão. Aqui assistimos ao mergulho constante de dois miúdos a quem perguntei a idade, 9 e 10 anos, que saltavam da plataforma para o rio numa ação imparável. A esta atividade das crianças foi juntar-se o pai de um deles, dando continuidade à sequência de mergulhos para espanto dos transeuntes e turistas que àquela hora por ali se encontravam.

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Enquanto as noites ainda são quentes, não deixe de visitar o parque da Fundação de Serralves. Visitámos o parque à noite para  assistir a um espetáculo ímpar de luz designado por – “Há luz no Parque” – com a participação do artista João Paulo Feliciano que decorreu entre julho e o dia 09 de setembro. Consulte o programa de atividades no site da fundação e ficará surpreendido com os inúmeros programas que estão previstos acontecer.

Programe um fim de semana de dois ou mais dias pois para além do referido, há outras experiências a vivenciar no Porto, como por exemplo assistir a um espetáculo na Casa da Música, fazer um passeio de barco pelo Rio Douro, visitar as Caves do vinho do Porto, em outra altura lhe havemos de falar,  etc.

Antiga, Mui Nobre, Sempre Leal e Invicta Cidade do Porto

Lá na leal Cidade, donde teve
Origem (como é fama) o nome eterno
De Portugal, armar madeiro leve
Manda o que tem o leme do governo.
Apercebem-se os doze, em tempo breve,
De armas, e roupas de uso mais moderno,
De elmos, cimeiras, letras, e primores,
Cavalos, e concertos de mil cores.

“Os Lusíadas” – Luís Vaz de Camões
Canto VI – Estância 52